segunda-feira, 16 de julho de 2007

um momento...

A chuva caiu sem avisar, como um sorriso que some depois de uma péssima surpresa. Apalpei minha bolsa e pude sentir a água estuprando meus poemas e a firmeza da garrafa de uísque que comprei ontem e que tem de durar mais um dia pelo menos. Passo pela praça central como quem tem um punhal enfiado nas costas, me lembro do banheiro público que deve estar vazio. Entro e escolho um reservado, me sento no vaso e limpo com a barra da camisa as lentes dos óculos que estão salpicadas pela chuva. Ouço passos apressados como os meus e um solavanco na porta do reservado que estou. O golpe é forte e acerta em cheio meu rosto. Caio com sangue pela barba; " Meu nariz quebrado de novo" penso eu,masnão era. Apenas um cortezinho no supercílio esquerdo. Um zumbido também. "Filho da puta" digo me erguendo com dificuldade pela dor, pela surpresa e pelo espaço que não é muito. dou de cara com um garoto mais assustado que eu. Em pé, frente a frente, vejo que ele é pequeno e treme. "Desulpe moço, mas se eu não corro a polícia me pega." "O que foi que você aprontou?" "Estava acendendo um baseado ali perto da fonte, coisa pequena, Só a ponta. Por favor não me entrega não." Nem havia pensado nessa possibilidade "Quantos anos você tem?" "Quinze" "Você é louco? Ficar fumando isso durante o dia? E ainda mais debaixo de chuva, por que não veio para cá antes? Aqui é um sossego só." Ainda me lembrava da festa que havíamos promovido neste mesmo banheiro oito anos antes, eu, The Killer, Baby Face, Cajú, Samy Love e mais alguns... ficamos tocando violão, e papeando até o guarda aparecer e nos botar pra fora por que havia uma garota no banheiro masculino. Anos depois tinha tomado um tremendo porre enquanto apresentava um show de poesia no espaço cultural de onde o banheiro fazia parte e tido um revival com uma jovem ex-namorada. Bons tempos... " Nem pensei nisso. Quer dar um tapa?" "Não, valeu... não fumo." "AHHHHHHHHH VOCÊ NÃO FUMA? JUSTO VOCÊ??? " "Nem sempre os loucos são fabricados. Alguns nascem brisados. Eu bebo, por exemplo." "Sempre achei que tu fumava. Meu irmão lê algumas coisas que você escreve e sempre me disse que você deveria ser o maior maconheiro da cidade." "Bem a cidade nem é tão grande assim. Mas meu lance é sentir o uísque descendo pela garganta. Me reconforta" "De qualquer forma, valeu por não criar caso." "Meu filho cada um é livre pra seguir seu caminho." A chuva lá fora pareceu convidá-lo com mais força, da mesma forma que chegou partiu. Voltei ao reservado mas dessa vez mantive a porta aberta, abaixei as calças, acendi um cigarro pra mim, destarrachei a tampa e tomei um trago saboroso do meu uísque vagabundo. O mundo poderia acabar agora mesmo...

Jim d.

Um comentário:

Anônimo disse...

muito bom...
só faltou assinar!